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O Sagres da Marinha de Portugal Texto publicado em 21 de Agosto de 2007 - 01h16 | ||||
por Laire José Giraud * | ||||
A Cidade de Santos teve o privilégio de receber o navio-escola Sagres da Marinha de Guerra de Portugal. A Cidade e a comunidade luso-brasileira recepcionaram o famoso veleiro e sua tripulação de braços abertos. O navio-escola recebeu inúmeros visitantes, entre elas a apresentadora da TV Globo, Ana Maria Braga, que participou de um jantar oferecido pelo seu comandante, o capitão-de-mar-e-guerra José Luís Pimentel Antunes do Vale Matos, e aproveitou a oportunidade para gravar o programa Mais Você, onde integrantes do Sagres foram entrevistados. Também foram mostrados vários locais de bordo, além de ser comentado vários fatos históricos (veja vídeo da ocasião no site globo.com). O jornalista José Carlos Silvares já participou de dois jantares e de um almoço em viagens passadas do Sagres. Mas o que mais apreciou foi uma bacalhoada bem no estilo português, durante almoço com membros da tripulação. Silvares conta que ainda lembra do delicioso sabor desse prato que é um dos seus favoritos. Vale lembrar que o Sagres já foi o Guanabara da Marinha do Brasil, que anteriormente pertenceu à Marinha da Alemanha, onde seu nome de batismo era Albert Leo Schlageter. Ele foi transferido para a marinha estadunidense em 1945 e passado para nossa Marinha, onde participou de várias viagens de instrução de marinheiros e aspirantes do Colégio Naval (Angra dos Reis) e da Escola Naval (Rio de Janeiro), juntamente com outro famoso veleiro, o Saldanha da Gama. do Sagres com seu gurupés que é o mastro que prolonga O Guanabara participou dos festejos do IV Centenário da cidade de São Paulo, trazendo em seu bojo guardas-marinha, que desfilaram no Vale do Anhangabaú no dia 25 de janeiro de 1954. Um desses guardas-marinha que desfilou naquela data foi o comandante Dorian Castello Miguel. O atual presidente da praticagem de Santos, Fábio Melo Fontes, também recebeu instruções, quando aluno da Escola de Marinha Mercante, no Guanabara, do qual tem boas recordações. No exato momento em que escrevo este artigo, recebo um e-mail do comandante Carlos Eugenio Dufriche, respondendo a um outro que lhe enviei com fotos do Sagres deixando Santos no último sábado dia 11, que diga-se de passagem, debaixo de muita chuva, dando a impressão que a Cidade chorava com a partida do belo veleiro.
Por ser significativo e repleto de lembranças, transcrevo abaixo parte do texto desse comandante que sabe de tudo das nossas marinhas de Guerra e Mercante, cujo texto na íntegra, será motivo de um próximo artigo sobre o NE Guanabara: “Ótimas fotos, com o toque especial do dia chuvoso. Viajei no GUANABARA, hoje SAGRES, com minha turma da Escola de Marinha Mercante, em 1949. Do Rio fomos direto a Recife, uns 10 dias de viagem, muito balanço, muita gente enjoada e um trabalho hercúleo de levar todos os panos (velas) que se encontravam dobrados e guardados num paiol lá no fundo do navio, e colocá-los nas vergas. Mas olhando de longe, a recordação é boa. Valeu a pena ter feito essa viagem.”
Após a partida do Sagres, que assisti da antiga ponte dos práticos, onde também se encontrava o shiplover Emerson Franco da Silva, acabei lembrando de um artigo que fiz em parceria com o conhecido jornalista Armando Akio, sobre os veleiros alemães apreendidos em 1945 pelos Estados Unidos e repassados para outras marinhas como o caso do atual Sagres. Esse artigo foi publicado no jornal A Tribuna de Santos no dia 24 de dezembro de 1995. Por ser rico em informações, resolvi reprisá-lo conforme segue abaixo.
Veleiros da Alemanha fizeram escola Os veleiros ainda são utilizados como navio-escola pelas Marinhas de alguns países porque eles são um excelente laboratório para treinamento marítimo A Marinha da Alemanha teve três veleiros que fizeram literalmente escola: o Gorch Fock, o Horst Wessel e o Albert Leo Schlageter. Este último chegou a pertencer à Esquadra do Brasil, com o nome de Guanabara, e posteriormente à Armada de Portugal, que o rebatizou de Sagres II.
Esse trio de veleiros saiu dos estaleiros apesar e após a tragédia envolvendo o lugre-escuna auxiliar Niobe, navio-escola da Marinha alemã, que afundou em 1932, com 69 pessoas, atingido por uma tempestade com violenta chuva durante cruzeiro de verão no Mar Báltico. Um lugre ou lúgar era um navio à vela, de mastreação construída de gurupés e três mastros de lúgar. Gurupés é o mastro que lança do bico de proa (frente) para a parte frontal, no plano longitudinal, com uma inclinação de 35 graus acima do plano horizontal. Desafio “Para muitas nações, essa tragédia teria significado o fim do treinamento naval em veleiros, mas os alemães eram diferentes”, lembra Richard Coulton, em artigo na revista Sea Classic, de janeiro de 1981. O Navio-Escola da Guarda Costeira dos Estados Unidos USCGC Eagle fotografado em Lisboa, em 1991. Capa da Revista de Marinha de Dezembro de 1991. Foto: Luis Miguel Correia O Niobe precisava ser substituído por uma frota de modernas embarcações auxiliares, construídas conforme a classificação do Lloyd’s Register, a sociedade classificadora de navios com sede na Grã-Bretanha. Rapidez Os alemães não perderam mais tempo. Os navios eram “esguios e graciosos”, dispondo de equipamentos de convés operados manualmente, o que permitia maior empenho dos cadetes. Os veleiros eram equipados com a mezena dupla na popa (ré), típica dos navios alemães conhecidos como Cape Horners. Mezena era o último mastro na ré.
O trio foi construído pelo Estaleiro Blohm & Voss, de Hamburgo, Alemanha, que produziu excelentes Cape Horners no século XX. O primeiro da série foi o Gorch Fock, construído em 1933, com porte de 1.510 toneladas, batizado com o nome de pluma do poeta alemão Johann Kinau, morto na Batalha da Jutlândia em 31 de maio de 1916. O segundo a ser lançado foi Horst Wessel, em 1936, um pouco maior que o primeiro. O Albert Leo Schlageter saiu do estaleiro em 1937. Destino alterado A Segunda Guerra Mundial alterou radicalmente o destino dos três navios-veleiros. Eles foram convertidos em cargueiros. As águas do Mar Báltico tiveram o privilégio de serem sulcadas pelo trio. As embarcações levavam homens e suprimentos entre a Prússia Oriental e a Alemanha.
Contam que o Horst Wessel derrubou três aviões aliados. Tal fato o coloca como um dos últimos veleiros da História a participar de um combate armado. O outro lado Como uma guerra não é feita exclusivamente de vitórias, os navios conheceram também o outro lado. O Gorch Fock naufragou ao largo de Stralsund, na Alemanha, no início de 1945. O Albert Leo Schlageter foi avariado por minas. O Horst Wessel escapou por pouco de afundar, quando deixou de entrar em Kiel, Alemanha, na noite em que um ataque aéreo aliado afundou todos os navios que estavam no porto.
O fim da Segunda Guerra Mundial representou uma nova etapa na vida dos três veleiros, inclusive do Gorch Fock, que foi resgatado pela União Soviética em 1948 e, após uma intensa reforma, foi colocado em serviço de novo, em 1951, com o nome de Tovarishch (que significa Camarada, em russo). É de se lamentar que a Marinha do Brasil não tenha um veleiro-escola. (N.do R.: Na época do artigo não tinha, mas passou a ter o nosso glorioso Cisne Branco). O País já teve grandes navios à vela, como o Benjamin Cosntant, o Almirante Saldanha da Gama e o Guanabara. EUA encamparam embarcação O veleiro-escola alemão Horst Wessel foi encampado pelos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial. Ele passou para a Marinha norte-americana em 11 de abril de 1946, no Porto de Bremerhaven, Alemanha, com o nome e Eagle (Águia).
O Eagle começou a operar de novo 41 dias depois, como o cúter da Guarda Costeira dos Estados Unidos. Cúter é um veleiro usado em regatas à vela. Ele zarpou em 30 de maio da Alemanha e chegou a Nova Iorque, na costa leste norte-americana, em 8 de julho de 1946. Durante a viagem, houve tempo calmo e algumas tempestades. De Nova Iorque, o Eagle continuou viagem rumo ao novo berço de atracação, ao lado da Academia da Guarda Costeira em New London, Conecticut. Ele continuou sendo utilizado para treinamento de marinheiros da famosa Guarda Costeira estadunidense. O cabrestante da âncora foi motorizado. Cabrestante é a máquina destinada a içar a amarra da âncora e que consiste em um tambor que gira em volta de um pião ou de um eixo vertical. A Guarda Costeira também providenciou a substituição da vela dupla de ré no mastro da mezena por uma única vela de popa. Ficaram as amarras de alguns dos aparelhos originais. A tripulação média do Eagle é de 19 oficiais e 49 homens na guarnição e um máximo de 180 cadetes. Treinamento em veleiro O treinamento em veleiro é vital para que os marinheiros conheçam a força da natureza, saibam se virar em situações desafiantes, como tempestades ou mar bravo. A importância que a Marinha dos Estados Unidos dá ao treinamento dos marinheiros em navio à vela é explicada pela mais séria derrota naval sofrida pelos norte-americanos na Segunda Guerra Mundial.
Em 1944, no Mar das Filipinas, as forças dos Estados Unidos e do Japão travariam combate. Mas os norte-americanos enfrentaram antes um inimigo poderoso: um tufão no mar. As pesadas perdas ocorreram não apenas pelas forças da natureza, mas também pela marinhagem precária. Brasil O veleiro alemão Albert Leo Schlageter foi apreendido pelos Estados Unidos como indenização de guerra e imediatamente entregou ao Brasil, que o manteve como navio-escola com o nome de Guanabara, até 1961. A Marinha de Portugal comprou o Guanabara naquele ano. Ela o queria para substituir o Sagres I, que era um antigo navio da série Cape Horners, o Rickmer Rickmers, construído na Alemanha em 1896.
Principais Características Nome: Sagres II Tipo: veleiro-escola Estaleiro: Blohm & Voss, do Porto de Hamburgo, Alemanha. Bandeira: Portugal Nomes anteriores: Guanabara e Albert Leo Schlageter (original) Construção: 1937 Comprimento: 98,34 m Boca (largura):12,00 m Deslocamento:1800 Tons Calado: 5,5 m Altura do mastro: 45,5 m Propulsão: Velas: Armação em barca com velas partidas. 1979 m² de superfície vélica. Dez velas redondas e 14 velas latinas. Motor:- Motor Diesel (MTU), de 1000 CV e velocidade de 10 nós Guarnição: 9 oficiais, 17 sargentos e 113 praças O navio tem capacidade para embarcar 63 cadetes, sendo 12 femininos. Finalizando, recomendo, para os que gostam das coisas do Sagres, que leiam a reportagem Bom filho a casa torna, de autoria da jornalista Cláudia Rodriguez. | ||||
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* Laire José Giraud é despachante aduaneiro, colecionador de cartões-postais da Cidade e de transatlânticos antigos. Colaborador da Revista de Marinha de Portugal. Publicou cinco livros, como autor e co-autor, sobre temas da Santos antiga. | ||||
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